quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Por uma maior participação

Vejam abaixo a reportagem do boletim Artigo34 sobre a participação de Adolescentes na defesa dos seus direitos.

Dois anos após a Declaração dos Adolescentes apresentada no III Congresso Mundial de Enfrentamento da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, a participação juvenil no enfrentamento da violência sexual registra avanços importantes, mas ainda apresenta desafios

Direito à participação
Publicada no Brasil, em 2008, a Declaração dos Adolescentes para Eliminar a Exploração Sexual foi um importante resultado do III Congresso Mundial sobre o tema. O texto, anexado ao documento final do evento, representou um marco na promoção da participação de meninos e meninos no enfrentamento da violência sexual.
A declaração traduz concretamente o direito à participação política de crianças e adolescentes, previsto em diversos pontos da Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança. Dentre os trechos da Convenção que tratam do assunto de forma mais explícita, podem ser destacados: o Artigo 12, relativo ao direito de garotos e garotas serem ouvidos em procedimentos jurídicos e administrativos que os afetem; o Artigo 13, que garante a liberdade de expressão; e o Artigo 23, sobre a participação ativa da criança e do adolescente na vida comunitária.

Meninos e meninas são cada vez mais reconhecidos como atores políticos relevantes no enfrentamento da violência sexual, seja pelo potencial mobilizador que possuem, seja pela contribuição que suas vivências trazem ao debate. Entretanto, ainda é preciso consolidar metodologias, reformular espaços de discussão e desenhar políticas permanentes para a promoção do direito desse segmento etário à participação política.
Mais do que um compromisso previsto na Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança e reforçado no III Congresso Mundial de Enfrentamento da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, a promoção do direito à participação é fundamental para a formação cidadã de crianças e adolescentes. No caso específico da temática da violência sexual, também significa dar voz àqueles que são diretamente afetados pelo problema.
Para a representante jovem da Ecpat na América Latina, Ana Lídia Rodrigues Lima, a garantia desse direito deve ser considerada como uma diretriz fundamental das ações de enfrentamento da violência sexual. “É impossível confrontar qualquer problema relativo a um determinado segmento sem que a participação dele, no papel de sujeito político, seja uma questão central. É com empoderamento que garantimos os direitos desse sujeito”, afirma.
Tal ponto de vista é compartilhado pela assessora da Participação e Não Discriminação da Save The Children Suécia, Gina Solari, uma das coordenadoras da pesquisa “Participação e Violência”. Desenvolvido pelo escritório regional da organização para a América Latina e Caribe, o estudo focaliza meios de incluir meninos e meninas de forma mais ativa no enfrentamento dos diversos tipos de violência, incluindo a de caráter sexual. “Meninos e meninas têm a capacidade de participar e devem ser preparados para isso. Tudo depende de a sociedade reconhecê-los como sujeitos de direito, criando condições para que eles desenvolvam essa habilidade”, afirma a pesquisadora.

Contribuição ao debate
De acordo com o coordenador do Programa Cidadania dos Adolescentes do Unicef Brasil, Mário Volpi, a participação desse público é capaz de revelar alguns aspectos da violência sexual que permaneceriam negligenciados, caso o debate ficasse restrito aos adultos. “É uma abordagem diferenciada, seja em relação à linguagem, pois eles vão direto ao ponto, seja em relação ao tipo de iniciativa que fazem, com muito mais criatividade. Eles tentam envolver as pessoas não só pelo ponto de vista jurídico, dizendo que a violência sexual é um crime, mas também pela dimensão afetiva, pelos sentimentos que esse tipo de violação desperta”, afirma.
Da mesma maneira, a secretária executiva do Comitê Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, Karina Figueiredo, avalia positivamente a contribuição dos jovens que participam das ações da instituição. “O enfrentamento da violência sexual têm de contar com o olhar das crianças, adolescentes e jovens. Afinal, temos aí a visão daqueles para os quais nossas ações estão direcionadas, daqueles que vivenciam ou poderiam estar vivenciando essas situações”, observa.
Outra dimensão da participação juvenil que deve ser destacada é o grande potencial de meninos e meninas para mobilizar outras pessoas dessa faixa etária em ações de prevenção e enfrentamento da violência sexual. “Nós jovens somos as pessoas mais adequadas para lidar com outros jovens. Nós sabemos o que estão pensando, o que estão fazendo, o que estão discutindo e o que estão sentindo”, explica o representante juvenil da rede Ecpat na África, Jonathan Ssembajwe.

A participação efetiva
Para o educador social e ponto focal juvenil no Comitê Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual, Rodrigo Corrêa, o esforço para valorizar a participação de adolescentes e jovens no III Congresso Mundial, realizado no Rio de Janeiro em 2008, merece ser destacado. “Houve um avanço com o evento. Hoje já se reconhece a importância da opinião de crianças, adolescentes e jovens nesse processo”, afirma.
Envolvido com a temática desde sua adolescência, o educador tem hoje 25 anos e participa das discussões relativas à revisão do Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil. Ele reforça a importância de se garantir uma incidência efetiva do jovem em espaços de discussão, abandonando um modelo de participação simbólica em que a presença juvenil em eventos e fóruns não significava necessariamente uma influência na formulação de políticas.
Mário Volpi, do Unicef, compartilha da mesma preocupação. Apesar de reconhecer a presença simbólica desse público como um primeiro avanço, ele acredita que a oferta de atividades formativas para as representações juvenis poderá contribuir para consolidar um verdadeiro diálogo. Ele aponta como exemplo a ser estudado o processo de preparação desenvolvido no Brasil antes do III Congresso Mundial, com a realização de fóruns regionais junto aos adolescentes que participariam do Congresso.
Para Volpi, essa iniciativa foi fundamental por preparar os adolescentes para um debate qualificado. Contudo, ele defende a necessidade de realizar tais atividades de forma mais constante. “O desafio agora é consolidar essas redes em atividades mais articuladas. Os processos formativos não podem ser apenas direcionados a ações pontuais, mas devem se tornar políticas permanentes de governos e organizações”, avalia.

Metodologias participativas
Um dos maiores desafios apontados por aqueles que desenvolvem atividades relacionadas à participação de crianças, adolescentes e jovens diz respeito a adequação dos espaços de representação para as especificidades desse público. Uma das soluções encontradas no III Congresso foi a criação de um espaço onde os adolescentes poderiam fazer intervenções usando linguagens da arte e da comunicação.
Para Ana Lídia Rodrigues, da Ecpat, tal iniciativa representou um avanço significativo, que deverá ser retomado e aperfeiçoado em próximos encontros. “Aquele espaço conseguiu reunir os jovens e teve um papel importante. Mas não devemos pensar que as atividades ‘sérias’ são para os adultos e as ‘lúdicas” são para os jovens. O ideal é que a juventude possa dialogar entre si, mas também com os adultos”, afirma. É o mesmo que defende Rodrigo Corrêa, do Comitê Nacional de Enfrentamento: “para poder participar de eventos e espaços de representação, não são apenas os jovens que têm de se adaptar, mas os adultos também”.
Mário Volpi acredita, inclusive, que a reformulação dos espaços de debate e das metodologias de participação em função da presença de um público jovem pode trazer benefícios para o movimento social como um todo. “Repetir as metodologias antigas não é bom nem para adolescentes e jovens nem para os adultos. Por exemplo: ninguém quer mais um palestrante falando para 500 pessoas e depois um espaço para cinco perguntas. Precisamos ter condições de gerar processos mais participativos, que permitam um diálogo maior”.
Nesse sentido, o III Congresso também apresentou avanços, uma vez que grande parte de suas atividades foram ofertadas seguindo o modelo de oficinas com atividades práticas. Caberia aos próximos eventos aprofundar experiências como essa.

Consolidação de uma política
Com todos os esforços recentes no fomento à participação de crianças, adolescentes e jovens, já não há dúvida sobre a importância de se investir nesse campo. Contudo, um desafio importante apontado tanto por jovens quanto por adultos ligados à questão trata-se da consolidação de uma política permanente nesse sentido. “Temos de garantir a sustentabilidade das ações. Qualquer mobilização depende de internet, de equipamentos, de impressão, de passagens, hospedagem etc. Tudo isso custa dinheiro”, avalia Rodrigo Corrêa, do Comitê Nacional de Enfrentamento.
De acordo com Mário Volpi, as iniciativas de estímulo à participação de jovens ainda continuam dependentes de convênios pontuais e costumam girar em torno da realização de eventos e outras atividades isoladas. “Chegou o momento de consolidar linhas de financiamento e diretrizes de apoio para garantir a continuidade dessas ações”, afirma.

Saiba  mais sobre  o Boletim  artigo34  nos links abaixo


O boletim Artigo 34 tem o objetivo de dar continuidade às discussões desenvolvidas durante o III Congresso Mundial de Enfrentamento da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, realizado em 2008 no Brasil. O nome do informativo se inspira na Convenção Sobre os Direitos da Criança adotada pela Assembleia Geral da ONU em 1989, que, em seu Artigo 34, estabelece o compromisso de todos os Estados Membros em proteger a criança contra todas as formas de exploração e abuso sexual. Contato:
artigo34@andi.org.br

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